quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Um disco / Red Hot Chili Peppers



Quando se fala de Red Hot Chili Peppers, quem tem menos de 30 lembra de discos mais recentes - e mais populares também. Alguns até lembram de Blood Sugar Sex Magik, aquele que alavancou de vez a carreira do quarteto californiano - e mais adiante merece aparacer nessa coluna -, que continha, entre vários hits, as absolutas Give it away e Under the bridge. Mal sabem, no entanto, que dois anos antes a melhor formação dos Peppers lançara o real estopim para a sua mistura rotulada como funk-metal: Mother's Milk, nosso UM DISCO de hoje.

Não se engane, no entanto, achando que esse disco de 1989 é o primeiro dos pimentas. Antes desse vieram outros três, que se primavam pelo som original criado pela trupe, pecavam na produção, digamos, crua demais. Era treino, melhor definindo. O que deve ser dito é que era outra banda: Anthony Kiedis e Flea sempre estiveram lá, mas a bateria era de Jack Irons e as guitarras de Hillel Slovak, amigo da dupla principal que se afundou em drogas o bastante para finalizar sua participação terrena. Depois disso, Irons deixou a banda, com medo de que todos rumassem para o mesmo abismo - Kiedis também era um "eplorador" nato nesse mundo. No entanto, veio o controle - que durou tempo suficiente para remontarem a banda com a melhor formação que os Peppers já tiveram: para a cozinha, Chad Smith, o homem que come baquetas no café da manhã foi o escolhido; e para as guitarras, um prodígio, fã da banda com apenas 18 anos, chamado John Frusciante. Banda refeita, era hora de criar um clássico.

O que ficou dos álbuns anteriores e que perpetuou em Mother's Milk foi a pegada funkeada do baixo de Flea e a voz característica de Kiedis, que pontuava as letras psicodélicas, viajantes - e por vezes confusas, mas sempre divertidas. Era um caldeirão de temperos esperando adicionais. Smith incorporou e aprimorou as baquetas apimentadas como se sempre estivesse estado ali - e isso fica claro até hoje. É como se a identidade do peso e ritmo tivesse sido encontrada. O garoto Frusciante, por sua vez, colocou sua visão de fã na mistura, o que rendeu (também) a identificação imediata com o restante do prato. E que prato. O início com Good Time Boys, um funk com balanço pop, apresenta a nova banda com levada madura, mas ainda (e graças!) com a picardia juvenil. A letra entrega: "travel round the world/gettin naked on the stage/bustin' people out of their everyday cage" (viajando pelo mundo/nus no palco/tirando as pessoas de suas gaiolas diárias). Lembrando que, até essa época, os Peppers eram conhecidos como os "garotos com as meias no pau", só com as meias. Ficar pelado no palco era uma constante - que a popularidade, depois, cobrou o retorno das roupas.

Para a mistura mais elevada, Subway to Venus se apresenta como carro chefe nessa solução mágica. Aqui, outros elementos começam a aparecer na música dos pimentas, como um sax veloz e o trompete, tocado pelo próprio Flea em Taste the Pain. Essas duas canções poderiam definir o álbum sozinhas, não fosse a peculiaridade de outras tão representativas quanto. Caso de Knock me Down, canção-hino do disco feita em homenagem ao companheiro Slovak e referenciada diretamente nos vícios dele e da banda. "If you see me getting mighty/if you see me getting high/knock me down/i'm not bigger than life" (Se você me ver ficando poderoso/se você me ver ficando alto/me derrube/eu não sou maior que a vida). Na verdade, todo o álbum é dedicado ao músico, como diz o encarte.

Em Fire, cover de Jimi Hendrix remanescente de um EP anterior, The Abbey Road (isso mesmo!), conta ainda com as presenças de Slovak e Irons, e entrou no disco também como homenagem, e era a música que eles costumavam acabar os shows na época - nus. Outra cover presente no álbum, e que alavancou as vendas do disco, é a versão única de Higher Ground, de Stevie wonder, que ganhou a roupagem dos pimentas como se fosse deles. Aliás, os Peppers, quando fazem cover de alguma música (e eles gostam muito disso!), o fazem com a propriedade de donos, algumas ficam irreconhecíveis - e ótimas! Fire ficou mais rápida, mas Slovak respeitou todos os acordes do mestre; e Higher Ground mudou de velocidade, melodia, quase tudo. E ficou mais famosa do que a original.

Nas variações musicais, ainda sobra espaço para uma música instrumental (a bela Prettly Little Ditty), um punk rock clássico (Punk Rock Classic), outro à la Peppers (Nobody Weird Like Me), e mais letras sacanas, com a sensual Sexy Mexican Maid e a bagaceira Stone Cold Bush. Ah, e ainda deu tempo para outra dedicatória: fãs dos Lakers e de um dos maiores astros do time, Magic Johnson traz o ritmo das quadras em forma de música. Impossível não bater cabeça com a batida rápida de Chad e Flea durante toda a faixa, bem como a intervenção certeira de Frusciante e os vocais insandecidos de Kiedis - impossíveis de acompanhar para cantar, nem tente. Para finalizar, a música mais longa do disco, Johnny Kick a Hole in the Sky, um hino apache que vem numa crescente contagiante, para, quando o disco acaba, ficar aquela vontade de ouvir de novo. E porque não?

Os "good time boys" conseguiram, fizeram um disco clássico. E nem sabiam disso ainda.


Luciano Seade

Red Hot Chili Peppers
Mother's Milk

1) Good Time Boys
2) Higher Ground
3) Subway to Venus
4) Magic Johnson
5) Nobody Weird Like Me
6) Knock Me Down
7) Taste the Pain
8) Stone Cold Bush
9) Fire
10) Pretty Little Ditty
11) Punk Rock Classic
12) Sexy Mexican Maid
13) Johnny, Kick a Hole in the Sky
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